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13.4.11

DESCOBERTA DO BRASIL


Saber quem chegou primeiro ao Brasil revela-se tarefa quase impossível. Certo é que todos chegaram antes de Cabral.

1 – N última década do séc. XV, Portugal e Castela competiam ferozmente para obter a primazia no delineamento de uma rota para o Oriente. Foi um complexo processo político-diplomático, talvez dos mais empolgantes de sempre. Um processo que deu origem a vários Tratados: Alcáçovas, em 1479, definido a área de influência no Atlântico norte e sul, longitudinalmente; Tordesilhas, em 1494, de que resultou a partilha do Novo Mundo; Acordo de Saragoça, em 1529, na partilha do oceano Pacífico e Ásia Oriental.

Retirar o comércio levantino aos turcos e venezianos era o grande desiderato. Fazê-lo primeiro do que a Espanha era imperativo para Portugal.

2 – Bartolomeu Dias passou o Cabo da Boa Esperança em 1488. A rota que seguiu era, ainda, a tradicional. Uma rota junto à costa africana, com a terra à vista (ou quase). Bartolomeu apenas desceu mais um pouco, entrando nas águas do Antártico. Quando subiu, estava já no Índico. Mas, a partir de 1493 era já conhecida a chamada “volta pelo largo” que, a partir da zona da Mina, se entranhava pelo mar alto, aproveitando, depois, os ventos alíseos para descer. De facto, nesse ano, Abrãao Zacuto, apoiado por mestre Diogo e pelo médico José Vizinho, aperfeiçoara as tábuas quadrienais de declinações solares que permitiam a navegação em alto mar.

D. João II pretendia assegurar o domínio do Atlântico Sul, que lhe proporcionaria o exclusivo do Caminho Marítimo para a Índia, contornando a África pelo largo. A negociação do Tratado de Tordesilhas teve tudo a ver com isso. Daí a extensão de 100 para 370 léguas a Oeste de Cabo Verde, consideradas necessárias para efectuar a “volta pelo largo” com segurança. Secundariamente, havia o objectivo de obter novas terras a ocidente, de que se suspeitava (ou sabia…). Estes objectivos foram tão importantes que o rei não hesitou em fazer concessões a Castela: cedeu territórios no norte de África; permitiu a presença de pesqueiros espanhóis entre os cabos Não e Bojador (África); e, acima de tudo, renunciou ao projecto de indicar D. Jorge, seu filho bastardo, como sucessor (Castela não queria). Curioso, e abonatório da tese de que algo se sabia, é o facto de, prevendo o Tratado uma comissão mista para realizar uma expedição conjunta no sentido de determinar com rigor os marcos divisórios nele estabelecidos, nunca Portugal designou os seus representantes, pese embora as insistências de Castela.

Em Tordesilhas, devido à tenaz negociação de João II, ficou definido o futuro Brasil tal como o conhecemos hoje. Um território que ainda “não existia” e, no entanto, já lá estava.

3 – Morto João II, sobe ao trono D. Manuel I, seu primo. Em Outubro de 1497, D. Manuel casa com Isabel filha dos Reis Católicos. Quase simultaneamente morre o herdeiro dos tronos espanhóis. D. Manuel, por força do casamento, vê-se, de repente herdeiro de todos os tronos da Península. Embora com muitas vozes contra, D. Manuel acaba por aceitar as coroas de Castela e de Aragão. Parte para Espanha. Ainda jura o trono de Castela, mas já não o de Aragão. A mulher morre no parto. Manuel perde a qualidade de herdeiro presuntivo do trono e regressa rapidamente a Lisboa. Aqui, tudo se precipita. De novo a competição feroz. O rei quer impedir os Castelhanos, e até os ingleses que começavam com expedições a partir de Bristol, de ocupar terras que por direito (do Tratado de Tordesilhas) lhe pertenciam. Manda Duarte Pacheco Pereira em missão ao Atlântico Sul, para determinar com exactidão os limites da nossa zona de influência. Duarte, o “Aquiles Lusitano”, chega ao Brasil em Novembro de 1498, a partir da ilha de Santiago, em Cabo Verde. No seu escrito Esmerado de Situ Orbis, descreve, com grande detalhe e rigor, paisagens, gentes e costumes. Dá também indicações preciosas das latitudes e longitudes. Prova dessa descoberta é, também o Planisfério de Cantino, onde pela primeira vez aparece a representação cartográfica da região Brasílica.

4 – Mas se foi Duarte Pacheco Pereira o descobridor do Brasil, que se passou para não ter sido de imediato oficializada tal descoberta?

Pouco depois da descoberta de Pacheco Pereira, fundeava no Tejo a nau Bérrio, a 10 de Julho de 1499. Trazia a notícia da descoberta do caminho marítimo para a Índia. De imediato se desencadeou intensa actividade diplomática. Dois dias depois D. Manuel escreve aos Reis Católicos, a Maximiliano I e ao Papa, Alexandre VI. Em Castela o feito de Vasco da Gama convenceu os Reis Católicos a ignorar definitivamente as teses de Colombo, que caiu em desgraça. Rapidamente e em força decorreram os preparativos para a 2ª Armada à Índia. A 9 de Março de 1500 sai de Belém uma armada comandada por Pedro Álvares Cabral. Já não era um “pirata”, mas um nobre e um diplomata. Nove naus, três caravelas e uma naveta de mantimentos. Fazem a “volta do largo” e são arrastados para ocidente. A 10 de Abril passam no trecho da costa entre o cabo Calcanhar o rio de São Francisco. Os efeitos combinados das correntes “das Guianas” e “brasileira”, levam a frota para a Bahia de Todos-os-Santos. No dia 21 encontram ervas e aves. A 23 aproximam-se de uma embarcação com 18 ameríndios. A 25 de Abril a frota entra na baía, onde fundeia. Estava achada a Terra de Santa Cruz. Em terra ficariam dois grumetes e uns poucos degredados. Para aprendizagem da língua local e recolha de informações. A naveta, capitaneada por Gaspar Lemos, foi enviada para Lisboa, dando ao rei a boa nova. A frota segue para a Índia a 2 de Maio.

5 – Foi descoberta? Foi achamento? Puro acaso? Acção deliberado? Foi Cabral? Foi Duarte? A pergunta parece supérfula, porque o Brasil há muito estava descoberto. A questão é porque se demorou tanto a comunicar. A oficializar a descoberta. É estranho, se considerarmos que não havia dúvidas, face ao Tratado de Tordesilhas.

A verdade é que D. Manuel tinha receio. Receio de Castela. Quando a mulher morreu, o filho de ambos, Miguel de la Paz, ficou entregue aos avós, os Reis Católicos. Miguel passou a ser o herdeiro de todos os reinos da Península. D. Manuel ainda não tinha filhos. As insistências de Castela e outros factores “diplomáticos” que levariam muito tempo a contar, acabaram por vencer D. Manuel. Em Março de 1499, nas Cortes de Lisboa, Miguel de la Paz é jurado herdeiro de Portugal. Era o sonho de D. João II, agora invertido: um só rei peninsular, mas agora castelhano. É aqui que reside o segredo. Havia uma dívida de gratidão para com os Reis Católicos. Foram eles que defenderam o seu direito à sucessão contra o bastardo D. Jorge. Mais, Manuel precisava de comprar prata à Espanha par negociar as especiarias no Oriente. Sabia que a expedição de Gama tinha sido um enorme revés para Castela… Enfim, não lhe interessava dar a entender que para além de África e da índia, ainda tinha interesses a ocidente. Por isso, atrasou a informação. Não havia telejornais. Pode fazê-lo. Também por isso, terá dado instruções secretas a Cabral para simular um acaso, um “achamento” acidental, quando desde 1498 já sabia do Brasil, através da viagem de Pacheco Pereira. A reserva era tal que mesmo depois da naveta de Cabral ter chegado, a Junho de 1500, as primeiras notícias só circularam a partir de Junho de 1501. Um ano depois! Curiosamente, nessa altura já Miguel de la Paz tinha precocemente falecido, com apenas dois anos de idade.

O Brasil foi descoberto por Duarte Pacheco Pereira, em 1498, descoberta oficializada por Cabral, em 1500, e destinava-se apenas a operacionalizar a rota do Cabo. Hoje o Brasil é um continente e pode ser descoberto por todos nós.

Jorge Pinheiro

Publicado no blogue Olhar Direito.

24.9.09

D. PEDRO IV - O EX-TUDO

O ex-rei e ex-imperador D. Pedro IV de Portugal e I do Brasil, foi abdicando de tudo, até abdicar precocemente da vida aos 35 anos, no dia 24 de Setembro de 1834. Morreu em Queluz, no mesmo quarto em que tinha nascido. Viveu num dos períodos mais conturbados da história contemporânea. Uma fuga caótica para o Brasil, acompanhando o rei D. João VI e toda a corte portuguesa, escapando precipitadamente a Napoleão. A passagem de regime absolutista para o constitucional. A regência do Brasil, num clima de turbulência entre tropas portuguesas e pró-nacionalistas brasileiros. Abriladas, Belenzadas, Setembristas, Vilafrancadas, Maria da Fonte, em Portugal. Clima de "PREC" permanente. A independência do Brasil. Quinze anos de lutas fractícidas com o mano Miguel. Foi na qualidade de ex-imperador do Brasil e ex-rei de Portugal que ele desembarcou com 7 500 homens na ilha Terceira (Açores) e reconquistou o poder para entregar à filha Maria II. Quando finalmente ganhou, morreu. O seu coração foi extraído e, por vontade testamentária, levado para o Porto, cidade que lhe garantiu a lealdade contra D. Miguel. Um rei desorientado que nem na morte se soube encontrar. Figura polémica: para uns herói; para outros, traidor; para alguns, sem carácter.
Recomenda-se leitura de: "Um Herói Sem Carácter", de Isabel Lustosa; "O Coração do Rei", de Isa Salles; "O Império à Deriva", de Patrick Wilcken.

22.1.09

ESTÁCIO DE SÁ

Não tendo sido colonizada pelos portugueses nos anos que se seguiram à descoberta do Brasil em virtude da hostilidade dos indígenas Tamoios, a baía de Guanabara foi ocupada por colonos franceses, sob o comando de Nicolas de Villegagnon. Ali tentaram instalar a “França Antártica” (1555-1567). A expedição e instalação francesa tiveram o apoio muito directo do ministro Gaspar Coligny. A instalação inicial deu-se na ilha de Serigipe, onde foi construído o Forte Coligny, estendendo-se depois para terra, ocupando a zona entre a actual praia do Flamengo (onde desagua o Rio Carioca) e o outeiro da Glória. Aí, os franceses iniciaram a construção de uma cidade, Henriville, em homenagem ao rei Henrique III e que poderia vir a servir de refúgio aos protestantes huguenotes perseguidos em França. Cidade rudimentar que logo foi destruída pelos portugueses, dela não há vestígios hoje em dia.
A 22 de Janeiro de 1565, Estácio de Sá, com mandato da regente portuguesa D. Joana de Áustria (na menoridade de D. Sebastião), embarca da praia de São Vicente, alguns quilómetros mais a norte, como uns mamelucos e uns quantos tupiniquins e ataca os franceses que acabam expulsos. Seria o fim do devaneio francês e o princípio da “cidade maravilhosa”. A 1 de Março desse ano, Estácio funda a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro (em homenagem ao príncipe português) em terreno plano, ali entre os morros Cara de Cão e Pão de Açúcar, onde constrói uma paliçada (actualmente Fortaleza de S. João). Estácio morre dois anos depois na batalha de Uruçu-mirim (praia do Flamengo) ferido por seta indígena dos Tamoios que lhe vazou um olho e terá originado uma septicemia.
Desses tempos heróicos nada resta. A cidade cresceu sobre terra dos tupiniquis, dos tamoios e dos tupinambás. No séc. XVIII surgiu o caminho que do centro da cidade segue a São Cristóvão, através da Rua Matacavalos (actual Rua do Riachuelo), passando pela Estrada de Mata-Porcos, hoje Largo do Estácio, onde ainda podemos encontrar a Igreja do Divino Espírito Santo.
O samba moderno nasceu no Bairro do Estácio. A primeira Escola de Samba do Brasil foi criada em 1928 por Ismael Silva, Bide, Marçal, Mano Edgar e outros. A chamada “Turma do Estácio” costumava reunir-se na subida do morro de São Carlos, no Estácio. Essa Escola passou a chamar-se “Deixa Falar”. Pretendia-se romper coma tradição de violência entre os blocos dos vários bairros e criar um novo tipo de Carnaval. Como a rivalidade era grande e todos se achavam superiores, o pessoal do Estácio dizia “Deixa falar”. O nome ficou. A Escola não chegou a participar no primeiro desfile oficial, em 1932. Nessa data tinha-se transformado em rancho. O samba era uma mistura de maxixe, modinha, polca e jongo. As primeiras escolas de samba apropriaram-se da estrutura de dos cortejos e das procissões e apressaram a linha melódica associada a uma intensa cadência rítmica para imprimir mais andamento a esse cortejo. As fantasias só foram obrigatórias a partir de 1949. Entretanto no morro nascia a escola “Unidos de São Carlos”, actualmente “Estácio de Sá” e cujo momento alto foi a conquista do título de 1992, com o enredo “Pauliceia Desvairada”!!!
Um Largo muito musical a que certamente não foi alheia a seta indígena que inflamou a vista ao fundador Estácio de Sá, fazendo-lhe, assim, apurar o ouvido. Lá nasceu também o nosso querido Luiz Melodia que nos perseguiu a adolescência (vá-se lá saber porquê) com aqueles versos endiabrados e inconsequentes: “Se alguém quer matar-me de amor/que me mate no Estácio/bem no compasso/bem junto ao passo/do passista da escola de samba/do Largo do Estácio/O Estácio acalma o sentido dos erros que eu faço/trago não traço/faço não caço/o amor da morena maldita do Largo do Estácio”.
Imaginem se os franceses têm ficado por lá… Andava tudo muito huguenote, sem samba, sem desfile, sem fantasia e em vez do Luiz Melodia tínhamos o “xarope” do Adamo da Antártica a cantar “Tombe la Neige” sem caipirinha. Safa!
jp