1 – Cada vez mais a política será escrutinada, mediatizada, feita em directo. As novas tecnologias e a obsessão das estatísticas, associada à paranóia das sondagens permanentes, farão dos políticos homens cada vez mais timoratos e da política um mero exercício de curtíssimo prazo. Os programas eleitorais não vão resistir a uma semana de más sondagens. A tendência será a de agradar, mesmo que se governe mal. Não perder votos será o único objectivo. Ganhar. Captar o voto. Esquecer o homem e as necessidades concretas. É nisto que se irá esgotar a democracia. Não um homem um voto, mas um voto por homem. Mero somatório. Anunciar medidas populares, sem qualquer perspectiva de as praticar. Nenhum político no futuro se atreverá a tomar medidas impopulares, mesmo que sensatas. Tudo que não potencie voto será adiado ou mascarado. A legislação confusa e deliberadamente incompetente, encarrega-se de baralhar a situação, enquanto uma burocracia ineficiente se encarrega de adiar os processos. A lentidão premeditada da justiça impedirá que se julgue num único período eleitoral. Apenas o economicismo triunfará e baseado num conceito simples: ou tens dinheiro ou não tens. Como o arranjas pouco importa. Este vai ser o fim do sistema. Do ciclo democrático, tal como o conhecemos. Ter eleições, só por si, não é democracia. De quem é a culpa? De todos. Da falta de estadistas. Da comunicação social especulativa. Das novas tecnologias intrusivas. Nossa, de nós todos, que exigimos o que não pode ser dado e preferimos esgotar comodamente o sistema a revoltar-nos.
2 – Morto este sistema (e não lhe dou mais de 20 anos), a pergunta é como será o novo ciclo? Regimes musculados? Ditaduras? Supressão de liberdades? Guerra? Ideologias religiosas extremadas? Tudo é possível, mas se houver ainda um mínimo de bom senso, haverá a compreensão de que à globalização económica, social e comunicacional, terá de corresponder uma globalização política. A noção de Pátria tem forçosamente de ser alterada ou abolida e a ideia de religião não pode substituir a de política. Terá necessariamente de haver a configuração de entidades politicamente mais amplas. Entidades que possam fazer a gestão de processos económicos em escalas muito maiores, obedecendo a critérios de verdadeira necessidade. Que permitam acudir a situações de carência conjuntural a determinadas regiões, não por caridade ou conveniência, mas porque tal lhes compete. Entidades que tenham força para negociar plenamente umas com as outras de igual para igual. Uma garantia de paz e redistribuição de recursos. Um equilíbrio que não exija permanentes barómetros e não necessite de se legitimar todas as semanas. Se assim não for, antevejo um final muito traumático, para não dizer violento. E o fim da democracia pode mesmo ser o fim do mundo.
3 – Quanto ao futuro da política em Portugal, para além dos epifenómenos para vender jornal e ouvir comentadores de pacotilha, ele estará absolutamente dependente do que acontecer no mundo neste final de ciclo. Uma certeza é evidente: não teremos qualquer voto na matéria.
8 comments:
Premunitório !
Caro Jorge,
Enquanto os sitemas permitirem que mei dúzia usufrua a seu belo prazer das vantagens, prejudicando tudo e todos, enquanto não houver responsabilização, será muito difícil mudar o estado das coisas... A mentalidade dos Homens, não permite que se exerçam as tarefas de gestão pública, sem recurso na maior parte das vezes a esquemas com uma total falta de princípios e moralidade...
A falta de responsabilidade e as consequências que se tirarm da práticas deste tipo de actos, normalmente são inteligentemente apelidadas de "Consequências Políticas "... e depois de meia dúzia de dias de "castigos dourados" surge sempre uma qualquer nomeação para cargos de gestão... e lá voltamos nós ao princípio...
É o que temos, talvez mesmo o que merecemos, pois nós é que, votando, permitimos que esses senhores estejam onde estão...
Um abraço
Uma postagem que é mais do que uma mera postagem.
Lucidez na análise do momento que vivemos.
Inteiramente de acordo com o seu ponto 1 e com o ponto 2.
Quanto ao ponto 2, aí já não serei assim tão convergente...
Se os vinte anos se reportam a Portugal, devo dizer que o timing que dou é inferior a metade desses 20 anos.
Não me querendo deter em pontos concretos em que não perfilho da sua opinião ( Pátria, Religião), gostaria de saber se inclui a África (especialmente vários países que são considerados ricos economicamente) nesse seu desenho de uma nova configuração.
Um abraço com todo o apreço deste seu amigo e admirador incondicional.
Boa análise, Jorge!
se...
...houver um retrocesso a tempos mais remotos, onde "a palavra" tinha valor
...o conceito de responsabilidade e a consequente responsabilização forem, igualmente, valorizados
...talvez o prognóstico se modifique...
Que lírica, m.a.! - Este ano ainda vais passar a noite de 24 na chaminé à espera do Pai Natal, quiçá do Menino Jesus... -
Caro Jorge, a tua cínica visão do futuro pode estar certa mas espero que o amanhã dos nossos filhos não seja tão negro.
Obrigado pelos comentários. Tenho pena de estar cínico, mas é a vida!
João: sim, incluo todos. África também. O mundo é uno e pequeno. Cada vez mais pequeno.
voce nao é cinico, é pura verdade o que diz...
bjs
Beijos também.
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