Consta que Viriato
andou por aqui perdido entre matas de castanheiros e alcateias de lobos. Viriato era um fedelho irrequieto e insuportável. Pastava
entre a Meseta Ibérica e os Montes Hermínios. Manhã cedo, saia do tugúrio
familiar com um casqueiro de bolota e uma cabaça de aguardente de zimbro para
matar o bicho.
Perna curta de
montanheiro, envolto em mal curtido bedum de cabra. Percorria despenhadeiros
graníticos em equilíbrio instável. Sonhava vertigens heróicas de libertação
radical. Estamos em 160 a. C. O tempo era romano. O espaço incerto. O modo
troglodita.
O rapaz pertencia
à tribo dos Lusitanos de origem duvidosa. Eles próprios não sabiam donde vinham
e muito menos para onde iam. Seriam Celtas? Iberos? Atlantes? Os romanos
chamavam-lhes “pernix lusis” (ágeis
lusitanos), visto não pararem quietos e serem difíceis de agarrar. Nós não nos
atrevemos a chamar-lhe o que quer que seja, para não ferir susceptibilidades.
Viviam amontoados
em castros de lusalite. Labirintos em chapas de zinco. Vielas enlameadas em
fezes de caprino. Cheiro insuportável a urina. Sebes de couve galaica aparadas em
caldo verde. As mulheres
estavam permanentemente grávidas, lavando pilhas intermináveis de louça,
enquanto os homens se divertiam em monumentais hecatombes com sacrifícios de
bodes e prisioneiros das tribos rivais.
Povo anarca e
incivilizado. Os romanos bem tentaram discipliná-los. Mas, nada. Como diria um
general romano: “A Ocidente da Península
Ibérica há um povo que não se governa, nem se deixa governar”.
Viriato deveria
ser julgado em acção popular por gestão danosa da “res publica”. Por sua culpa
atrasou-se a entrada na Comunidade Económica Romana em quase 150 anos. Foram
pontes, estradas, aquedutos, subsídios e, talvez mesmo um novo aeroporto, que
ficaram por fazer. Que diríamos hoje de quem nos tivesse impedido de aderir à
União Europeia? No mínimo “albanês”!
Dos Lusitanos
ficou o mito. A fama de um povo inquebrantável e “iluminado”. A História é
mártir do devir e nós idiotas do nacionalismo.
Finalmente, em
138 a.C., três amigos de Viriato, Ditalco, Minuros e Audax, homens esclarecidos
e com grande sentido de estado, tiveram o bom senso de assassinar o caudilho,
sob o alto patrocínio do procônsul Quinto Servílio Cepião que, sabe-se lá
porquê, teimava em nos integrar na Comunidade Económica Romana.
Os rios continuam
a correr revoltos. As montanhas abruptas continuam a despenhar-se no vazio.
Portugal é Terra de Lusitanos. Viriato está por todo o lado. A Beira somos nós.
Jorge Pinheiro
Jorge Pinheiro
Texto editado no nº 2 da revista "The Printed Blog" (http://www.tvi24.iol.pt/videos.html?mul_id=13465495)
8 comments:
Pronto, se tinha dúvidas, fiquei quase esclarecido.
Eu nãoi me considero "beirão", mas sou descendente. Agora não acredito que todos o sejamos. Assim pergunto :
1) Será que o Jardim também é ????
2) E os gajos que imaginaram o aeroporto de Beja também???
HUMMMM!!!! acho que não, mas ...
Um abraço e parabéns pelo texto cheio de humor.
Tirem-me do Algarve, por favor...
Férias?
E o presidente cá do sítio a vender Porto de Mós, Meia Praia e os Índios...
Portugal é terra de lusitanos. Nós também somos.
:)
Mena
Gosto do mito, gosto de Viriato, dos Romanos nem por isso, mas GOSTO do teu texto :))
beijo
Quando comecei a ler, pensei : O Jorge está a repetir um post , coitado...
Mas, no final, concluo que o COITADO sou eu, pois tinha-me esquecido de lhe dizer que achei muita graça quando diz que > Viriato era um fedelho insuportável e que também percorria os seus trilhos em equilíbrio instável <.
Também apreciei o texto do GONÇALO WADDINGTON !
Um abraço.
Fernando: eu acho que somos todos... uns mais outros menos. O espírito Lusitano não me agrada.
Mena: e agora têm algas venenosas...
Graça: Viriato dá para tudo. Nem sabemos se existiu...
João: sempre comprou a revista?
De facto este texto é um arranjo de um anterior. Por isso parece repetido.
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