6.9.08

PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL

A 6 de Setembro de 1633 os holandeses atacam a vila de Iguarassú, no Recife, sendo completamenre rechaçados pelas forças portuguesas. Este foi mais um episódio da longa luta ibero-holandesa que se iniciou no fim do séc. XVI e que se travou até 1668 por sete mares e quatro continentes. Esta foi, verdadeiramente, a Primeira Guerra Mundial.
O Império Marítimo Português, que começara com a conquista de Ceuta, em 1415, estendia-se agora por todo o mundo. A derrota e morte de D. Sebastião (o rei imbecil), colocou Portugal na rota de sucessão de Filipe II de Espanha, igualmente rei de dos Países Baixos (Holanda). A Guerra dos 80 Anos travada pelos holandeses pela independência contra a Espanha, serve de pretexto para o ataque feroz destes contra as possessões portuguesas. A guerra travou-se não só na Flandres e no Mar do Norte, mas também no interior de Angola, no estuário do Amazonas, na ilha de Timor, nas costas do Chile ou no mar da China e nas águas do Japão. Verdadeiramente mundial! A ganância holandesa associada ao odium theologicum e às dificuldades porque passava o império português, provocou uma maior incidência de ataques contra as colónias e praças lusas do que contra as espanholas, mais resguardas no interior dos continentes e mais bem defendidas. Calcula-se que a Holanda tivesse, então, cerca de 1700 barcos de guerra, contra 300 portugueses.
Com Portugal de novo independente (1640), a guerra acabaria em 1668/69, em grande parte graças à mediação inglesa (que fica com Bombaim e Tânger) com a assinatura da paz entre Portugal, a Espanha e as Províncias Unidas (Holanda).
Curiosamente, embora com graves perdas, o império de Portugal resistiu muito razoavelmente. Pode dizer-se, em termos de balanço final, que a Holanda ganhou na Ásia, empatou em África e perdeu no Brasil. Só que enquanto no Brasil a derrota da Holanda foi completa, na Ásia a vitória foi parcial. Os portugueses mantiveram-se lá até ao séc. XX.
As razões desta "vitória" são várias e curiosas. Nenhuma do foro directamente militar. Os portugueses tinham muito maior enraizamento nos locais, por mais remotos que fossem. Muitos tinham lá constituído família. Aonde chegassem pensavam em estabelecer-se para sempre, contrariamente aos holandeses que iam apenas fazer uma comissão de serviço. A língua portuguesa era uma língua franca e comercial que todos falavam. Mais fácil que o holandês. Os próprios holandeses acabaram por ter de a aprender, para conseguirem comunicar com os nativos. Os portugueses tentavam melhorar o sítio aonde chegassem. Os holandeses destruíam tudo. Os portugueses empregavam mão de obra local e comerciavam com margens menores, dando mais lucro aos locais. O factor religioso (e aqui os jesuítas fizeram a diferença) foi fundamental. O zelo dos "papistas" era muito superior ao dos pregadores calvinistas. De tal forma que os holandeses foram sempre considerados heréticos e conseguiram um número rídiculo de conversões. Os missionários católicos eram, então, verdadeiros embaixadores económicos. Finalmente, as doenças. Embora muito mais frágeis fisicamente do que os gigantes ruivos, os portugueses resistiam melhor às doenças tropicais. O império, porém, nunca mais seria o mesmo. Quebrado o monopólio no oriente por holandeses e ingleses, Portugal volta-se definitivamente para o Brasil.
jp

13 comments:

Manuela Araújo said...

Uns invejosos estes dutch's...

Maria Augusta said...

Voilà uma visão global do que aprendemos na escola no Brasil como "A Invasão Holandesa". Até hoje não sabia que se inseria num conflito mundial entre os holandeses e os ibéricos. Concordo com você que os portugueses chegavam para se enraizar nos locais, se misturando com a população local. Sempre achei que ainda bem que conseguimos expulsar os holandeses, vendo no que deu a colonização deles na África do Sul, um país de racistas empedernidos, onde o apartheid durou até há pouco tempo.
Um bom domingo para você.

Só- Poesias e outros itens said...

Adorei estudar essas passagens importantes por aqui. Relembrar a história e essa intricada política.

Bjs.


JU Gioli

Anonymous said...

Gostei dessa "o rei imbecil". Também sou dessa opinião.

Silvares said...

Mas só tivemos um rei que pudesse ter esse cognome de "O Imbecil?".

Silvares said...

Mas não queria deixar de fazer notar que a Holanda é hoje, e por tradição, um país bem mais tolerante que Portugal. Aliás, basta passear por Amesterdão e Lisboa para compreender as diferenças. Com os invejosos dos holandeses a ganharem no meu coração. Malhas que os impérios tecem...

Anonymous said...

Um abraço,Jorge. Gosto imenso de "ir" com o expresso da linha.Dá-me mto. prazer. É sempre interessante.Tia cèu

Jorge Pinheiro said...

Tia Céu, um prazer "ouvi-la". Ainda bem que gosta. Sei que é exigente. Beijo.

Jorge Pinheiro said...

Silvares: não vou contrastar o passado com o presente. É um exercício complicado. De qq forma não estamos de acordo. Acho os holandeses muito mais intolerantes do que os portugueses. Disfarçam bem nos primeiros contactos, mas depois acham-se os melhores "lá do bairro" e são muito mais insuportàveis do que alemães e quase tão arrogantes como suecos. Claro que estou a generalizar. Masé a minha experiência. E, pelos vistos, já era assim naquele tempo!

Claire-Françoise Fressynet said...

Ai hoje estou com a tecla solta. Concordo com o teu comment Jorge e parece-me que aquelas leis que dão ideia de muita liberdade não são o que parecem.

Jorge Pinheiro said...

Claire: com a tecla solta?!

Silvares said...

Pelo menos está-se bem estando de passagem... quanto a tolerância diria que somos muito bem capazes de tolerar aquilo a que não damos importância, enquanto povo. Toleramos muitas coisas que simplesmente desprezamos. A arte e os artistas, para dar um exemplo. Mas as coisas estão a mudar. Digo eu.

Jorge Pinheiro said...

Silvares: percebo perfeitamente a parte da arte. E acho mesmo que há nos holandeses (como em muitos povos nórdicos) uma componente civilizacional e de cidadania invejáveis. Mas depois de contactos mais profundos vem a parte da arrogância e do "mando" ao de cima. E até o "excesso" de organização soa a falso. Nada a fazer. Sou herdeiro dos romanos!