1.12.08

AVENTURAS DE ARNALDO ROCHA - DE LISBOA A CALECUTE

Como dizia Santo Agostinho, o tempo não existe: o passado já passou; o futuro ainda não chegou; o presente acabou de passar. Arnaldo Rocha é um agente especial da poderosa “Organização” que tenta, desesperadamente, criar o “Quinto Império”, a união do norte e do sul, do leste e do oeste. Arnaldo Rocha percorre o tempo atrás do mito.
Publicação simultânea, em episódios, no Brasil (“Quem Conta um Conto”) e em Portugal (“Expresso da Linha”), todas as terças e sextas feiras
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EPISÓDIO I

“Cessem do sábio grego e do troiano
As navegações grandes que fizeram;
Cale-se de Alexandre a Trajano
A fama das vitórias que tiveram

Que eu canto o peito ilustre lusitano,
A quem Neptuno e Marte obedeceram;
Cesse tudo o que a Musa antiga canta,
Que outro valor mais alto se alevanta.”

Em 1481, Arnaldo Rocha veio a Lisboa com objectivos bem determinados. As coisas estavam a correr bem com a Escola Naútica de Sagres. Agora era preciso o grande impulso: descobrir o caminho marítimo para a Índia; encontrar o continente americano; provar que o mundo era redondo. Dar novos mundos ao mundo... e se mais mundo houvera, lá chegara!
Arnaldo veio ajudar...
Assim que Afonso V exalou o derradeiro suspiro, o velho aio, Egas Moniz Junior, correu a entregar uma carta ao primogénito D. João. A carta era do falecido tio-avô, Henrique de Sagres. João rompeu o lacre e balbuciou: “Se esta lerdes é que estais vivo e soides rei”. E terminava abruptamente com uma mensagem críptica: “No dia do trânsito solar de Vénus, apoia-te na rocha. Arnaldo será teu pastor”.
João não percebeu nada: “pastores?!”… “Arnaldos?!”... Toda a gente sabia que nos últimos anos de vida Henrique não batia bem da bola. Deixou de aparecer em público. Passava os dias despenhado na vertigem de uma rocha ao Atlântico virada, escrevendo bilhetinhos que metia dentro de garrafas e depois atirava ao mar. Dizia que estava a estudar as correntes...!

A sala abarrotava de gente. Calor de morrer. Pretos de serviço importados directamente da Mauritânia agitavam grandes leques em pena de avestruz. Papagaios coloridos entoavam cacafonicamente o hino nacional. Os dignatários rojavam-se perante Sua Alteza. O Principe Perfeito tomava posse... E a posse não estava fácil de tomar. João estava doido para mijar. Tinha virado uma litrada de “Mateus Rosé” para tirar nervos. Conde atrás de duque; barão sobre barão; cardeal pisando visconde; bispo cavalgando marquês… Uma procissão interminável. João dava a coroa por um penico. O embaixador egípcio sussurrou-lhe: “Magestade, óptimo dia para entronizar. Dia do trânsito solar de Vénus”!
João ficou estupefacto. Sem tempo para respirar, surgiu-lhe à frente, vindo do nada, um homem magro, vestido de gabardina, gravata e lunetas escuras. Pede para se aproximar. Segreda-lhe: “Eu sou Rocha e sobre mim erigirás o “Quinto Império”, e fez-lhe o “arnaldinho” cabalístico.
João viu o Mestre de Avis, o rei Artur, D. Dinis, o tio Henrique, o pai Afonso... Todos, todos se reflectiam no olhar cego daquele homem. Disse-lhe: “Vinde amanhã comigo ter. Às onze será um prazer”… gaguejou, irritado por ter versejado.
Poesia: Luís Vaz de Camões, a quem agradeço a colaboração.
(Continua na 6ª feira)
jp

2 comments:

Anonymous said...

Que bom que o Arnaldo Rocha voltou, e chegou num momento importante e decisivo para o historia de Portugal...e do Brasil, se ele ajudou na preparação das navegações.
Um grande abraço.

Jorge Pinheiro said...

Maria Augusta: atenção que este episódio é arrasador!