7.4.09

EFEMÉRIDE - CAMÕES

De origem galega, não se sabe se nasceu em Coimbra ou Lisboa. Talvez entre 1517 e 1525. Uma incógnita. Em 1549 vai para Ceuta ao serviço de D. João III. Perde um olho vítima de seta moura. Volta a Lisboa onde, mesmo sem olho, se atira a todas as mulheres. Foi longe demais. A irmã de D. Manuel I queixou-se. Foi desterrado para a distante vila de Constância, hoje a uma hora de distância, utilizando a A23. Em 1552, depois de uma rixa com um fidalgo, é embarcado à força para Goa onde escreve grande parte da sua obra épica, mesmo sem o olho. E este foi um problema fatal que afectou a nossa soberania. Porque não se ficou, o talentoso poeta, pelos sonetos, pelas redondilhas ou pelas composições hendecassílabicas? Porque teve de escrever os malditos “Lusíadas”? Ainda sim, mesmo sem olho, foi sempre combatendo ao lado dos Vice-Reis da Índia, chegando a ter o honroso título de “provedor dos defuntos nas partes da China”. Talvez por isso, em 1556 parte para Macau. Viveu numa gruta e naufragou… Preferiu salvar o seu manuscrito dos “Lusíadas” a socorrer a sua amante chinesa, Dinamene, que morre afogada. Mais um infeliz acontecimento que não podia ter ocorrido. Se o manuscrito se tem perdido, talvez os Filipes não tivessem vindo. Veja-se o paradoxo. O homem faz um livro imortal, épico e de exaltação patriótica. Dez anos não eram sequer volvidos, o rei morre sem descendente; Portugal é derrotado pelos mouros e, de seguida, perde a independência para os castelhanos. Pior era difícil! Depois de Macau, Camões regressa a Goa onde acaba preso por dívidas. É deportado para Portugal… uma verdadeira contradição na aplicação das penas e mais um erro do destino. Ainda houve esperança. Sem dinheiro fica-se pela ilha de Moçambique e podia perfeitamente ter lá morrido e o livro com ele. Mas não. Dois anos depois Diogo do Couto aporta na ilha e dá-lhe meios para viajar, sem saber, coitado, o mal que fazia! Camões chega a Lisboa pobre e miserável a 7 de Abril de 1570, faz hoje precisamente 439 anos. Mas chega ainda a tempo de ler os “Lusíadas” ao jovem rei Sebastião na corte de Sintra, tendo com esse tresloucado acto contribuído decisivamente para aumentar a alucinação do rei, abrindo-lhe as portas do desastre de Alcácer Quibir. O rei morre no deserto. Camões jaz nos Jerónimos.
Camões era um poeta do amor. Um valdevinos… E assim devia ter ficado. Deixo-vos com um pérola do seu génio indiscutível. Uma das damas da corte, para o inferiorizar, chamava-lhe cara-sem-olhos, numa alusão à sua cegueira. Eis a resposta:

Sem olhos vi o mal claro
Que dos olhos se seguiu:
Pois cara-sem-olhos viu
Olhos que lhe custam caro.
De olhos não faço menção,
Pois quereis que olhos não sejam;
Vendo-vos olhos sobejam,
Não vos vendo, olhos não são.

5 comments:

Lília Abreu said...

Jorge,
Bem, esta divirtiu-me, rs
1º pensei: bolas, não me livrodos lusíadas. Depois, só me dava para rir.
Constância, ai se Constãncia falasse.
"mesmo sem olho se atira a todas as mulheres", rs
E não sabia da cara-sem-olhos...
Está uma efeméride hilariante mas muito informativa. Será que já ensinam assim os Lusíadas aos miúdos?
Abraço
Lília

Lizete Vicari said...

Adoro a maneira que escreves!
E gostei muito da resposta de Camões.
Um beijo. lili

Maria Augusta said...

Não sabia que Camões teve uma vida tão movimentada. Ele foi um gênio, sem duvida.
Abraços e um bom dia para você.

Silvares said...

O zarolho era tramado. Bem que me engasguei na prova oral de Português do meu 9º ano (sim, frequentei o ensino unificado nos 1ºs anos da sua criação, fui vítima e rato-de-laboratório nos primeiros passinhos do célebre "eduquês"). Lembro-me de avançar para a solitária carteira em frente ao júri com uma braçada de livros a rezar cá para mim "Tudo menos Os Lusíadas, tudo menos Os Lusíadas..." quando me sentei ouvi uma das vozes lá de cima dizer "Abra Os Lusíadas e leia a Invocação." Raios, o que era isso de "A Invocação"? Agora já sei.

Alice Salles said...

Que vida, e que cara, foi salvar o manuscrito e não a amante!hahahahha Morri de rir! Sem contar que realmente, pra que essa obra foi sobreviver!? É um terror!