
Tendo adiado a minha ida para o Algarve por causa da morte do Xico Zé, resolvi aproveitar o dia de hoje para adiantar mais um pouco a digitalização dos slides do Roberto. Aproveitei e levei uns da minha família. Sentado na cadeira que pertenceu ao falecido Roberto, os slides eram um verdadeiro cemitério de imagens. O Xico aparecia por todo o lado. A Bia, que morreu de cancro há dois anos, também surgiu de repente. O Guito, falecido há três semanas num acidente na Mauritânia, resolveu aparecer inopinadamente. O Zé Maria também lá estava, como se ainda vivesse. Então os slides de família eram uma notícia necrológica de página inteira: avós, bisavós, tios, primos, pai... Slides de mortos. Cada vez mais mortos. Quase todos mortos. Digitalizo mortos que saem vivos das imagens sepultados em caixas escuras no bafio do passado. Imagens vivas de gente morta. Imagens que ficaram à espera da morte para se revelarem. Gente que reconheço vagamente. Gente vinda de muito longe. Vinda das brumas da adolescência. Jovens que não existem mais. Dou-lhes de novo vida. Revivem em Jpeg no "positive film", a 720 dip, nos 24-bit Color. São imagens que vejo com dor e saudade. Com prazer e angústia. Com alegria e raiva. O passado é o "preview" scannado. É uma vida que existe em imagem e não existe já viva. Como se fosse uma imagem morta. Sinto-me traído por todos os que me abandonaram. Todos me deixaram sozinho a tratar das imagens que eles não vão ver. Sinto uma luta contra o tempo. Acabar a digitalização antes que mais alguém morra. Sinto-me enterrado no caixilho de cada slide, numa angústia de morte no fundo de cada imagem.
jp
17 comments:
Jorge,
compreendo mas não recomendo. O assunto de morte acaba matando nossas esperanças!
Forte e VIVO abraço
Jorge, sei que é dificil o que está a passar.
O pouco que lhe posso ajudar é dizer-lhe que reveja essas fotos com um sorriso. Bem grande!!!
Porque tenho a certeza que depois vai estar mais tempo com "eles"
Forte abraço e espero que passe este momento rapidamente
JORGE
Vai desculpar-me: tive que me rir (bom, foi assim tanto para dentro quanto fui capaz...).
Este seu novo texto tem o seu quê daqueles filmes italianos quando eu tinha metade da sua idade agora.
Eram dramas, mas a gente ria-se sempre. Nem que uma lágrima também viesseespreitar o que se passava na tela.
Scannar é bom. Bem melhor que aqueles estupores que nos pregam sacanagens.
Um abração.
(Vá ver o 7º comentário lá a Bragança...)
Express,
Recorde essas imagens, uma a uma, em carinhos diferentes e especiais momentos que lhe chegaram à memória. Depois guarde-as como sejam o seu segredo...vai ser saudável quando voltar um dia a olhá-las!...porque saudade é falta de algo que foi bom e não é para ser esquecido mas sim recordado!
Beijinho
Jorge,
Olha, vim espreitar os comentários mas nem me atrevia a comentar. Até ver o do João. Desculpa também, mas estou morta de riso. Tal e qual o João, tb tentei (tanto quanto possível) rir para dentro. Mas, quando cheguei´à parte "acabar a digitalização antes que mais alguém morra" aí, foi mais forte que eu. E subscrevo o JOÃO, antes scannar que sacanagem.
E, pelo sim pelo não, faz um bom trabalho. Não sabemos se vêm ou não.
E, sabes que mais? Viva a VIDA!
Deixa, mas é o "preview scannado", agarra na tua Maria e retoma as férias!
Que mania esta de desperdiçarmos o presente! Passamos a vida no passado: a conversa que já terminou, o mail que já passou, etc.
Carpe diem!
Com carinho,
Lília
Também tenho digitalizado e enterrado alguns, com esperança de me safar. ;)
Quando acabares esse trabalho, vem beber um café cá abaixo!
Este fim de semana cá temos a "Arte Doce"...
e aqueles gajos que imitam os Abba.
Torta de alfarroba,não é?
Beijo.
Mena: vou no Domingo. Depois telefono. Alfarroba, exactamente.
Dulcineia e João: ainda bem que se riram. Essa era a ideia. Nunca consigo estar muito tempo sem me rir. A tragédia é cómica.
Eduardo: vou seguir o conselho.
Francisco: isto passa, mas é duro.
Ellen: gostei da descrição da saudade. Saudade é bom. Obrigado. Faz um excelente contraponto com o meu texto.
Olá Jorge
Venho acompanhando o expresso passar por mim sem saber ao certo onde vou parar, de verdade não temo, mas não tenho pressa de em algum lugar chegar.
Acho que aprendi que morre quem esquecemos e essa lembrança não precisa ser continua, obrigatória,insistente, culpada e chata. Não preciso erguer altar, não preciso planfetar nem a minha lembrança anunciar. Basta eu seja de que forma for o momento sentir e dele lembrar, esse é o meu amar, pois a saudade é isso não é? Não devo morrer de tristeza, ( meu avô, pessoa que choro ao lembrar pois o amo tanto e nunca mais o verei...meu avô morreu de saudade, morreu de amor. Ele faleceu uns cinco anos após minha avó, estavam casados há mais de 60 anos, tiveram oito filhos, minha mãe é a mais velha. Perderam em vida o caçula que virou nome de avenida num acidente terrível, era sexta-feira santa, 24 de março de 1.977, ano bi sexto eu acho, então nnca sei quando lembrar. Tinha onze anos quando a tragédia ocorreu, mas nunca mais me esqueci dele...não devo isso a mim e nem a ninguém, não devo, escolho. Viver e melhorar aquilo que acredito. Ai que horror!!! Não quero melosidades, nem tão pouco hipocrisias, quero desafios com uma inteligente agressividade para dessas pessoas lembrar, gosto de provocar. Pois, descobri que amo quem não conheci e só posso me divertir se aprender a sentir a vida com a seriedade que ela pede, entenda como quiser, eu procuro entender como escrevo.
Contabilizo a dor nas imagens arquivadas
Tristeza, egoísmo, solidão, saudade.
Amanhã, ontem, hoje que confusão.
Sentimentos sentidos, esquecidos.
E num click a lembrança percebida
sentimentos mantidos.
Que saco!
Desvio pelos meus dias e a morte é tão
viva em minha vida. Passo sem lados e a tristeza insiste, persiste. Desvio, disfarço, fico arredio, mas de nada adianta continuo triste. Mas estou triste porque percebi que amei tanta gente, estou triste por ser amado por tantos, estou triste porque posso ficar sozinho, mas estou triste, estou triste por amor. Não deveria ser assim. Não posso apenas viver e escolher amar esse tal amor.Ficar indiferente. Não dá o amor "desalienou a mente" e o que faço com o pensamento, razão, lógica, sentimento, sensação. Sensibilidade, sintonia.
Afinidade, simpatia.
Dê o nome que quiser
a escolha
é sempre possível.
Bobagem! é tudo isso e um pouco mais, veja quantos filosofam sobre rsrsr!!!
Fico parado e o tempo passa por mim
como um expresso sem fim.
beijos Jorge e apreveite tuas férias, tuas fotos diárias estão muito agradáveis de ver e das tuas pessoas amadas poder conhecer.
panfletar
Obrigado Selena pela compreensão. Ainda que as fotos estão a sair bem. Beijos.
Alguem têm que permanecer para pertuar aos otros.
Pois, mas não sou eterno...
Ainda bem que eu não estou aí nesses slides...
Com que então, a ideia era essa.
JOÃO,
Já viu? Nós aqui cheios de pudor, outros a pesar as palavras com peninha dele e, aquele estilo genuínamente fatalista, é apenas para nos confundir? E, aínda o consegue? E ele a divertir-se com isto tudo. Porque a intenção era rir. Com franqueza! Só com um puxão de orelhas, não acha?
Há que desdramatizar. Quem melhor que tu para saber isso...
Cada vez que perdemos alguém que nos é querido sentimos esta angustia que nos traz a consciência que tudo é passageiro e pode acabar amanhã. Mas enquanto estamos aqui, "the show must go on" e felizes aqueles que alguém acha que vale a pena "revivê-los" escaneando suas fotos.
Abraços.
Obrigado Maria Augusta.
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