20.7.07

O CHOCALHEIRO DA BEMPOSTA

A convivência com forças sobrenaturais é vulgar aqui no nordeste. Muitas tradições e mitos vêm dos tempos pagãos e mantêm-se, embora nem sempre se saiba o que se anda a fazer. Corre-se mesmo o risco de transformar rituais sagrados em eventos turísticos. Foi o recente caso do desfile na Baixa Pombalina de Lisboa. “Ranchos de Caretos”, a maioria vindos da Galiza, que enfeitiçaram os lisboetas e demais turistas acidentais pela cor e exuberância transmitidos, mas que nada deixaram da realidade mágica que lhes subjaz.
Em Bemposta o Chocalheiro sai a pedir esmolas nos dias 26/12 (chocalheiro manso) e 1/1 (chocalheiro bravo), revertendo a receita a favor de Nossa Senhora das Neves e do Menino Jesus.
Diz a lenda que o demónio tentou Nossa Senhora. Como castigo foi penalizado a pedir esmola para ela e para o filho, o Menino Jesus. A lenda, pudicamente, não explica que tipo de tentação foi, deixando-nos abertura à imaginação. Eu, pessoalmente, acho que foi com “Ferrer Roché”.
O Chocalheiro é um ídolo taurino. Nas pontas dos chifres ostenta duas laranjas espetadas. Do queixo cai-lhe uma barbicha de bode. Da nuca pende-lhe uma bexiga de porco cheia de vento. Na testa tem um disco e escorrendo pela face, uma pequena serpente. Na mão esquerda segura uma tenaz e à cintura tem uma serpente de grande porte. Uma susto!
Descodifiquemos. O touro está ligado aos rituais de fertilidade. Representa a força física e criadora. A serpente está igualmente relacionada com a fertilidade e também com a imortalidade, anseio de poder e saber. Foi ela que apontou a Adão o caminho da deificação, comendo a “maçã”. Segundo Mircea Eliade: “A serpente simboliza o Caos, o amorfo. Porém, decapitá-la equivale a um acto de criação, passagem do virtual e do amorfo ao formal, ao Cosmos e à fertilidade”. Na Grécia e em Roma havia crenças que diziam que a serpente acasalava com todas as mulheres e na Índia as mulheres que querem filhos adoram as serpentes. Os frutos nos chifres são o símbolo dos frutos que se desejam para o ano que começa. São festas solsticiais. Há chocalheiros na Ásia Menor ainda hoje.
O “Chocalheiro” da Bemposta e o “Velho” de Vale do Porco são símbolos da Magna Mater Divina, a Terra Mãe.
A distribuição de”comes e bebes” durante os festejos, são restos de celebrações das Bacanais que por aqui ficaram. Hoje revertem para a Igreja, mas dantes não era assim. Era para o repasto bacanal que o chocalheiro fazia com outras pessoas de sua escolha.



1 comment:

Anonymous said...

desculpe mas a foto que tem do chocalheiro esta errada...

essa é a mascara do belho de vale de porco

foi so um alerta para uma correcçao...