Não foi de comboio, nem de metro que Afonso de Albuquerque chegou a Ormuz, a 21 de Setembro de 1507, faz hoje exactamente 500 anos. Foi por mar. Saíu de Lisboa em 1506, integrado numa armada de 11 naus e 5 navios de guerra.
Tristão da Cunha era o capitão-mor. Afonso de Albuquerque comandava os navios de guerra. O primeiro não percebia nada de navegação e tinha por missão conquistar a ilha de Socotorá, ali no norte da costa africana, no Mar Índico. Afonso Albuquerque ia vigiar a costa arábica, tentando controlar a entrada do Mar Roxo. Um era comerciante, o outro guerreiro. Não se gramavam e as cartas que de comando (regimento) de cada um não eram conhecidas pelo outro. Francisco de Almeida, vice-rei da Índia, esse não conhecia nada das instruções do rei. Mais, era ele, vice-rei, a quem competia ir a Ormuz! Confusos? Não vale a pena. É o monarca português no seu melhor: "Negócio da Índia"; "Coisas de D. Manuel"! O rei era perito nestas instruções secretas e contraditórias tudo regulando de Lisboa com a aquela mente mesquinha e minuciosa, cujas únicas preocupações eram "os muitos proveitos" e o engrandecimento da sua pessoa. A expansão da fé aparecia a letras pequeninas num post scriptum de última hora.
A caminho de Ormuz, Afonso de Albuquerque dominara já Calaiate, Curiate, Mascate, Çoar e Guarfação, cortando muitos narizes e mãos, incendiando muitos petizes e respectivas mães. Não porque tivesse necessidade, mas porque "ele tinha em vontade fazer nestes portos todos os males e destruições e mortes que pudese, para que indo a fama a Ormuz lhe tivessem medo e com temor fizessem o que ele quisesse. E isto tinha ele assentado em seu coração". Ou seja, não era por mal. Era uma mera táctica militar! Ormuz tremeria de medo e a doentia vaidade do capitão português impor-se-ia no Índico.
O regimento que recebera de D. Manuel não referia expressamente a tomada de Ormuz. Mas, por uma vez, o rei dava alguma flexibilidade ao capitão. O rei autorizava Afonso a agir "à sua guisa" quando achasse conveniente, em função da sua missão: fazer o que fosse preciso para controlar o comércio e apresar os navios mouros junto da costa da Arábia. Ora, é neste contexto, que se deve analisar a interpretação do arrogante capitão. Ele não queria apenas fazer umas vagas explorações ao longo da costa e andar "à galhofa das presas" no estreito de Ádem. A conquista de Ormuz seria já digna da sua "honra".
A 21 de Setembro de 1507, a armada chega, muito bem anunciada, ao porto de Ormuz. Afonso exige ao jovem rei Saif-ut-Dai, de 12 anos, a entrega da cidade e o pagamento de um tributo anual a D. Manuel. Se não concordasse, "veria em sua cidade e portos do mar tanto mal que tudo se tornaria em fogo e sangue" e em poucos anos ficaria pobre. Isto porque, dizia Afonso de Albuquerque, "o nosso costume é fazer mal a quem não nos quer bem"!
O rei de Ormuz tentou negociar com aquela estranha gente. Mas, acabou por tomar o partido de opiniões de homens mais jovens que não queriam ceder. A fúria portuguesa abateu-se sobre a cidade. Navios mouros abalroados. A cidade bombardeada. As negociações recomeçaram. É fixado o tributo anual e, por cortesia, as chaves da cidade são entregues a Afonso e Albuquerque. Mas o que Afonso queria era terra para erigir fortaleza.
Tal não aconteceu. Os capitães dos navios, liderados por João da Nova, revoltaram-se. Afirmavam que a missão não era Ormuz, mas Socotorá e que a construção da fortaleza e seu provimento era competência do vice-rei Francisco de Almeida, que nem sequer fora ainda informado! Ameaçavam não acompanhar Afonso se este persistisse. Como Afonso teimasse, os capitães foram-se à Índia. Em Fevereiro de 1508 Afonso de Albuquerque viu-se obrigado a abandonar Ormuz.
Termina assim a nossa fugaz ocupação de Ormuz, não sem que o Mar Roxo tivesse passado a encarnado, talvez pela quantidade de sangue derramado. D. Manuel ficou sem os seus " muitos proveitos" e os mouros perderam os benefícios da União Europeia.
500 anos passados sobre este idílico encontro, só por razões de conjuntura diplomática instável o Irão e Portugal não comemoram hoje a data festiva. Mas, o expresso da linha estava atento!
jp
2 comments:
Uma bonita e pitoresca história do humanismo português. Sempre a espalhar a Fé e o Império, aquele Albuquerque danado...
Mais um que não percebe o contexto histórico da altura e a dizer mal da nossa história. E tão preocupado a dizer mal que não sabe nem contar a história como deve ser e não quis dizer, ou não sabe, o resto da história. E o resto da história foi o regresso em 1515, a tomada de Ormuz, mais uma vez, o finalizar da fortaleza, etc, etc, etc
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