26.10.08

JET LEG - UM POUCO DE HISTÓRIA

E se mais mundo houvera lá chegara. Esta apóstrofe define bem o espírito dos Descobrimentos portugueses. Impelidos pelo serviço de Deus e pela cobiça, os portugueses chegaram às extremidades e ao coração do planeta. Curiosamente, embora impetuosos e desorganizados por natureza, os portugueses de quinhentos preferiram as certezas científicas à quimera… Por isso perderam a América. Era já tarde quando descobriram o Brasil. Esse avanço tecnológico que nos superiorizava às restantes nações navegadoras viria, um século depois, a ser ultrapassado pelos holandeses. A expansão marítima destes deve-se a vários factores que se conjugaram num momento irrepetível. Em termos políticos, a ruína de Antuérpia por ocasião da crise de 1576-1609 e da guerra dos Gueux que originou a independência dos Países Baixos; a união dos tronos de Portugal e Castela, de 1580 a 1640, que abriu uma frente e ataque às colónias portuguesas. Em termos sociológicos, os holandeses sempre estiveram intimamente ligados ao mar: o próprio país flutua abaixo da linha de água; a pesca sempre fora a actividade principal. A República das Províncias Unidas, saída do mar, dele tirou a sua força. Marinheiros fortes e experimentados; estaleiros navais com preços imbatíveis e tecnologia mais evoluída do que qualquer outro país. Em pouco tempo a Holanda assegurou o domínio dos mares. Contrariamente a Portugal e a Espanha, esse desenvolvimento não se ficou a dever ao impulso do Estado, mas à acção de companhias privadas. Em 1602 várias companhias rivais, num processo de fusão, criam a Oost Indische Kompagnie. O seu projecto era simples: ganhar dinheiro. A expansão da fé não era um desígnio. Evangelizar não lhes despertava interesse. Aproveitaram o desfalecimento dos portugueses para os substituir no comércio. Na Índia os seus lucros subiram de 15% para 75% em 1606. Depressa compreenderam que era preciso colonizar. Na Insulíndia fundaram Batávia (ilha de Java), em 1619. Em 1681 havia 2188 europeus na cidade, num total de 30 000 habitantes, na sua maioria chineses, filipinos e malaios. De facto, contrariamente aos portugueses e espanhóis, assim que acumulavam riquezas os holandeses só pensavam em voltar. Em 1621 foi fundada a Companhia das Índias Ocidentais que lançava os seus piratas Willekens e Piet Hein, na pilhagem das costas do Brasil e, simultaneamente, fundava na América do Norte, New Amesterdam. O apogeu desse período, no Brasil, foi com o governo esclarecido e tolerante de Maurício Nassau, que levou consigo urbanistas, pintores, escultores, cientistas e, também, muitos judeus e marranos da Península Ibérica que organizaram o comércio do açúcar e tabaco. Por essa altura Amesterdão possuía 60 refinarias de açúcar que exportavam para França e Inglaterra. A partir de 1640, os portugueses, já livres do embaraço castelhano, forçaram os holandeses a abandonar o Brasil. Estes mantiveram-se em Curaçau e nas Guianas. Simultaneamente, os ingleses começaram a sentir-se incomodados com este poderio comercial e naval. Era preciso expulsar os holandeses do mar. Logo que a guerra civil inglesa terminou. A promulgação dos Navigation Acts, por Cromwell, foi o detonador das três guerras anglo-holandesas, que terminaram nos Tratados de Breda. A Holanda perdia New Amesterdam, rebaptizada de New York; perderam toda a influência naval no Atlântico, apenas mantendo o Suriname. No oriente perdeu Ceilão e o Cabo para os ingleses, na quarta guerra anglo-holandesa. A Inglaterra, juntamente com a França, passariam a ocupar no Ultramar o lugar das Províncias Unidas. A decadência naval da Holanda foi irreversível. Para os burgueses holandeses passou a ser mais rentável a colocação de capitais noutras aplicações.
Busto de Maurício Nassau, Instituto Ricardo Brennand, Recife.
jp

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