Vivaldo estava há cinco horas a ser interrogado. Eram dois. Aquele
homem gordo que lhe tinha pedido o cartão de telemóvel no “KateKero” e outro
homem com ar de pugilista que o ameaçava com o olhar. Vivaldo já tinha contado
a história algumas trinta vezes. Encontrara o cartão nas tripas do cação. Agora
queriam saber de onde vinha o cação, quem o tinha pescado, a que horas...
Enfim, aquilo era surrealista! Acabaram por ir buscar o Viegas, o colega do
mercado, que confirmou a história toda. “O Gordo” sabia, agora, que o cação
fora comprado na lota, no dia 28, às seis horas da manhã, no dia seguinte ao
atentado. O cação fora pescado nessa noite e estava fresquíssimo quando chegou
à lota. Como o cartão ainda não tinha sido afectado pelos ácidos estomacais,
isso significava que teria engolido o cartão talvez duas ou três horas antes.
Na impossibilidade de interrogar o próprio cação, “o Gordo” dirigiu-se
rapidamente à lota e, através dos registos de venda, conseguiu identificar a
tripulação da traineira que que tinha capturado o cação. “Deus Me Valha” era um
daqueles barcos pequenos e coloridos de pesca artesanal, com uma tripulação de
três elementos e um cão. O mestre, Remualdo, lembrava-se perfeitamente do
cação. Já vinham de volta da faina, eram umas quatro da manhã. A noite tinha
sido fraca devido à nortada intensa. Perto da entrada, nos pontões de entrada
para a Marina, viram uma grande sombra dentro de água. Atiraram isco e apareceu
um cação esfaimado. Lançaram a rede e apanharam-no com facilidade. Era raro ver
um bicho daqueles tão perto da costa, mas acontecia. Aquela é uma zona de peixe
miúdo que surge ali em grande quantidade. O cação devia estar a caçar presas
fáceis e acabou caçado. Ou seja, alguém deitara fora um cartão de telemóvel,
numa zona de fácil acesso, pois há ali vários pontões. E, esse alguém, fê-lo
entre as treze horas de dia 27 e as duas da manhã de dia 28. A investigação
entrava agora noutra fase. O interrogatório de todos os habituais
frequentadores das pequenas praias circundantes, dos surfistas, dos pescadores
e dos empregados dos cafés de praia.
22.11.13
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2 comments:
espetáculo o nome do barco, os três elementos e o cão, a especificidade da pesca (investigação ou invenção?) e a trama vai-se esclarecendo para o inspetor...
Ótima saga ilustrada.
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