Valdemar tinha engendrado um plano simples.
Durante a tarde compraria uma faca de ponta em mola no mercado ilegal. Comprar
armas era a sua especialidade, não haveria de ter problemas. Depois do jantar
dariam um passeio pela beira da água. Talvez com o pretexto de lhe contar umas
confidências sobre o que ele tinha vindo fazer a Macau, Valdemar
aproximar-se-ia e apunhalaria Moema. O corpo seria empurrado para o rio. Quando
encontrassem o cadáver, se o encontrassem, já ele estaria no ar. O voo de
regresso a São Paulo estava marcado para sete da manhã do dia seguinte. Moema,
porém, previra tudo isto. Por trinta mil patacas tinha já comprado uma “baby
gun” no Bairro da Areia Preta, ali perto das Portas do Cerco. A Baby Glock era
uma arma que cabia na palma da mão e de uma eficácia espantosa. Escondia-se
facilmente. Pesava pouco e era de manuseio muito simples. Moema desconfiava que
ele iria tentar esfaqueá-la. Era o processo mais silencioso. Para isso
precisava de se aproximar. Não o faria durante o jantar. Só poderia ser depois.
Talvez a convidasse para um passeio à beira-rio. Durante o jantar falaram de
banalidades. Coisas sem relevância. Provavelmente tudo mentiras. Enquanto
Valdemar pagava a conta, Moema foi ao “toilette”. Mudou a pistola da pequena
carteira para o bolso direito das calças. Cá fora fazia um calor húmido. Uma
neblina intensa tornava a paisagem opaca. Valdemar conduziu Moema para longe da
zona de restaurantes. Moema deixou-se conduzir. Valdemar foi-se aproximando.
Moema agarrou a pistola dentro do bolso. Valdemar fez deslizar a lâmina da
faca. Moema destravou a arma. Valdemar aproximou-se ainda mais. Moema estava
totalmente alerta. Valdemar, praticamente encostado a Moema, segredou-lhe: “É
pena, porque você faz o meu género”. Desferiu uma violenta punhalada
direita ao coração, ao mesmo tempo que recebia o impacto de uma bala na cabeça.
Os dois corpos caíram como fuzilados por um raio. Ficaram ali no chão,
retorcidos, despojados de vida, admirados da morte. Foram encontrados pelas
duas da manhã. As autoridades policiais de Macau, numa avaliação muito
preliminar, atribuíram o caso a um desentendimento passional. Só depois de
perceberem que o passaporte de Valdemar era falso e que Moema era da polícia
brasileira, começaram a explorar outras pistas.
Em Lagos, “o Gordo” culpava-se
da morte de Moema. Em Bruxelas, a acusação contra a “Irmandade Branca” sofria
um importante revês. Em Marselha, um ex-etarra levantava uma encomenda
clandestina no porto e seguia para um discreto abrigo na Camargue. Daí sairia
para Espanha pela fronteira de Portbou. No dia 27 de Setembro estaria em
Granada, em visita à Capela Real
FIM
3 comments:
Quem não leu de um só tiro, no livro impresso, perdeu a oportunidade de ler em capítulos, ainda pode ler no arquivo deste Expresso. Grande conto. Vale a pena.
Ou pode encomendar o livro que tem mais seis contos.
Obrigado Eduardo.
Também gostei muito do conto e agora em fascículos com as fotos ficou ainda melhor! obrigada pela partilha (os outros contos também já os li e gostei muito!)
beijo
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