2.2.14

OPERAÇÃO CAÇÃO - XXXVII


Valdemar levantou-se tarde. Eram quase dez horas da manhã. Estava vagamente de ressaca, depois de uma noite de sexo e champanhe. O jet leg ainda lhe baralhava os fusos horários. Tropeçou até à sala de refeições. Numa mesa isolada a um canto da sala estava Moema, acabando o pequeno-almoço. Valdemar tinha a sensação de já a ter visto em qualquer lado. Teria vindo no avião? Seria actriz de cinema? Era uma mulheraça. Grande. Imponente. Vistosa. Valdemar adorava aquele ar decidido, quase militar. A boca expressiva. O cabelo arruivado. Peitos sólidos. Tudo na mulher era atraente. Valdemar sentia-se com sorte. Resolveu arriscar. Dirigiu-se à mesa dela e perguntou em inglês: “Posso-me sentar?”. Estranhou a resposta vir em português. E ainda mais estranhou o convite ser aceite com tanta prontidão: “Claro, dois conterrâneos devem confraternizar”, disse-lhe Moema. Ela era de São Paulo. Bióloga. Tinha vindo a Macau para uma conferência sobre a poluição nas grandes metrópoles. Ele inventou ser empresário e estar ali para fechar um negócio, o que não deixava de ser verdade. Moema fingiu acreditar e foi conduzindo a conversa para a geografia do Brasil. Confessou-lhe estar farta de São Paulo e estar a pensar estabelecer-se num sítio mais calmo. Como detestava o nordeste, estava a pensar ir para sul. Santa Catarina podia ser uma boa hipótese. Havia uma zona de que ela gostava particularmente, ali para os lados da Lagoa de Ibiraquera. A Praia do Rosa. A Praia da Barra. Garopaba... Nesta altura, Valdemar estava em estado de sítio. Ia acenando com a cabeça, mas tudo nele era tensão. Moema observava Valdemar e sabia que o tinha atingido. Ele estava alerta e desconfiado. Estava onde ela o queria. De repente, e a vida tem destes repentes, saiu-lhe quase sem querer: “Você conhecia um tal Octávio que foi assassinado em São Paulo no mês passado?”. Valdemar não queria acreditar. Balbuciou uma negativa e levantou-se para ir buscar mais dois croissants com queijo. Quem raio era aquela mulher? Começava a perceber que se metera na boca do lobo. Ela sabia tudo. Que ele mandara assassinar Octávio. Que vivia refugiado na Lagoa de Ibiraquera. Tinha-o seguido até Macau. O mais certo era saber do negócio dos explosivos. Era da polícia, com certeza absoluta. O que mais saberia ela? Sentiu-se vigiado e, pela primeira vez na vida, sentiu-se indefeso. Não tinha apoios em Macau. Não podia telefonar a Tsé-Lao e pedir-lhe ajuda. Era a confissão da sua incompetência. Tentou raciocinar. Tudo levava a crer que a mulher estava sozinha. Ela não podia ter qualquer apoio das autoridades de Macau. Tsé-Lao tinha as suas protecções no território. E as autoridades chinesas não eram conhecidas pela cooperação. Aquilo era China, que diabo! A mulher estava a “pescar” por conta própria. Só havia uma coisa a fazer.
Fotografia de Roberto Barbosa
(Continua)

2 comments:

daga said...

é o que dá quando se vai logo atrás de "um rabo de saia" ;)
(a foto excelente no contexto - como sempre - mas esta é especial...)

Jorge Pinheiro said...

Eu gosto de rabos de saia :))