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9.9.10

BRASIL - FORMAÇÃO - A GUERRA (XIII)

Como já vimos no episódio anterior, a civilização Tupi- Guarani organiza-se basicamente em TABAS (grupo local) que se situavam numa posição intermédia entre a menor unidade vicinal - OCA - e o agrupamento mais vasto - a TRIBO. Os chefes das Tabas - os MORUBIXABAS - não detinham poder coercivo. O seu poder baseava-se na persuasão, não podendo recorrer à força. Tinham tarefas pouco relevantes em tempo de paz, apenas ganhando importância em tempo de guerra.
A instituição colectiva base dos Tupi-Guarani era o Conselho dos Principais. O Conselho era formado pelos chefes das famílias mais extensas e pelos homens mais respeitados nas funções mágico-religiosas (pajés ou xamãs). Aqui se tomavam as decisões sobre a guerra e paz, sobre as alianças e se fixava a data para a execução ritual dos prisioneiros.
A guerra era a instituição fundamental dos Tupi-Guaranis., sendo considerado como o mecanismo central de reprodução social e de manutenção do equilíbrio cosmológico.
Todos os grupos com os quais não houvesse alianças, eram considerados como potencialmente inimigos. As guerras eram endémicas e obedeciam às seguintes motivações: conquista de habitats privilegiados; superação de tensões internas; captura de inimigos. A guerra favorecia o aparecimento de grupos maiores, fraccionando os mais fracos até que sucubissem. Este facto é devidamente observado pelos portugueses quando chegam ao Brasil e devidamente aproveitado, como veremos.
O objectivo primordial consistia em aprisionar, sacrificar e ingerir ritualmente o maior número possível de inimigos. As flechas eram envenenadas com curare ou secreções de rãs. Os combatentes eram os AVA homens entre os 25 e os 40 anos. As flechas eram disparadas a grande distância, acompanhadas de batidas de pés e ruído de pífaros feitos de ossos humanos. Na luta corpo a corpo era usado o Tacape, arma destinada a esmagar a cabeça o inimigo. Os combates terminavam quando uma das facções abandonava o terreno, deixando mortos, feridos e prisioneiros. As Ocas dos vencidos eram incendiadas e os prisioneiros capturados (homens, mulheres e crianças) eram levados. Cada um tinha a sua sorte, como veremos no próximo episódio.
(continua)

12.8.10

BRASIL - FORMAÇÃO - ORGANIZAÇÃO POLÍTICA (XII)


Os Tapajós, na zona amazónica, desenvolveram um sistema político-social específico - os cacicados- em que uma aristrocacia controlava os poderes militares e religiosos, prosseguindo uma política agressiva e expansionista, possuindo inúmeros escravos provenientes da guerra com povos vizinhos. Este modelo é uma excepção ao conjunto das comunidades indígenas ameríndias.
A generalidade dos povos, incluindo os Tupi-Guarani, adoptou uma forma de organização de grupo local (a TABA) que se situava numa posição intermédia entre a menor unidade vicinal ( a OCA) e o agrupamento territotial mais abrangente (a TRIBO). Uma das características mais evidentes das sociedades tupis era a falta de poder dos morubixabas (chefes), bem a não existência de métodos coercivos.  A liderança tinha como base apenas a pesuasão, não podendo recorrer à ameaça ou à força. Apenas era reconhecida a autoridade essencial da OCA (unidade familiar). Os "conselhos dos morubixabas" (homens bons?) teriam funções muito diversas, mas difíceis de apreender cabalmente. Sem dúvida tinham poderes de privilégio na escolha das mulheres fecundas, na repartição do espaço para habitação e nos rituais de sacrifício de prisioneiros. As atribuições dos chefes eram muito restritas em tempos de paz, limitando-se a poderes de orientação. Em períodos de guerra ganhavam preponderância, nas funções de direcção e comando.
A instituição básica das sociedades Tupis era o "conselho dos principais" que reflectia a predominância do poder gerontocrático masculino. Eram conselhos ao nível da aldeia. Conhecem-se casos de alianças informais entre aldeias vizinhas, politicamente autónomas. Não há provas de ter havido uma articulação mais abrangente, somente se conhecendo actuações concertadas em tempos de guerra. As teses de que, antes do contacto com os europeus, houve tentativas de organizar "estados emergentes", deparam com a resistência dos "grandes-pajés" (feiticeiros), que tudo fizeram para as inviabilizar. Estudos recentes demonstram, poém, que não haveria antagonismo entre morubixabas e pagés, mas antes uma complementaridade de alcançar o complexo central dessas sociedades: a guerra e a vingança. Veremos isso mais à frente...
(continua)

16.7.10

BRASIL - FORMAÇÃO - ORGANIZAÇÃO SOCIAL (XI)

Nas sociedades ameríndias imperava a divisão sexual do trabalho. Aos homens competia a caça, a pesca, o mutirão (trabalho de preparação das terras), a construção da habitação e a guerra. Competia-lhes também a tomada de decisões sobre a comunidade e o monopólio dos actos rituais. As mulheres cuidavam da lavoura, da cestaria e cerâmica, das tarefas domésticas, confeccionavam os alimentos, carregavam os mantimentos nas expedições guerreiras e retiravam a água das canoas quando os homens regressavam da pesca.

Os “brasis” agregavam-se em famílias extensas, tipo clã, normalmente constituídos por homem, mulher, dois filhos e cativos ou outros parentes seus dependentes. Estes agregados elementares constituíam uma “oca” (habitação) e ligavam-se entre si por laços de parentescos subordinados a um patriarca, o Principal. Somente um reduzido número de homens (o chefe, feiticeiro e os grandes guerreiros) praticavam a poligamia, representando o seu número uma fonte de prestígio (presumimos para o homem). As separações entre casais eram frequentes e numerosas.
Eram frequentes os casamentos exogâmicos (entre membros de povoações diferentes), assim contribuindo para estabelecer alianças políticas. Era, também, frequente o casamento avuncular (entre tio materno e sobrinha), modalidade preferida dos Tupinambás ou entre primos cruzados, assim se evitando a dispersão familiar (prática muito frequente na sociedade ocidental, mas com dispensa papal e isso faz toda a diferença…).
A regra residencial predominante entre os Tupis era a patrilocalidade (a mulher ia viver na oca do pai do marido), assim se favorecendo uma forma patrilinear de descendência. A matrilocalidade era minoritária, implicando a obrigatoriedade do homem se transferir para a habitação dos pais da noiva, onde constituía uma nova família nuclear. Neste regime, o marido era compelido a prestar dois ou três anos de serviço “público” no desbravamento da mata, na caça ou pesca, denominado “serviço da noiva” (uma espécie de dote que o homem, e não a mulher, levava!).

De acordo com as concepções tupis somente o homem tinha capacidade para conceber filhos, facto que condicionou os ritos de nascimento. A couvade era uma complexa instituição que implicava a rigorosa observância de um período de abstinência sexual por parte do pai, destinando-se a evitar que fossem introduzidos princípios ou substâncias malignas no corpo do descendente. Envolvia também rituais mágicos, competindo-lhe dar ao filho o nome de um antepassado. Tratando-se de menina, nesta fase final, o pai era substituído pela mãe ou por um irmão desta. Uma sociedade machista como qualquer outra.
As teses que durante muito tempo defenderam que as sociedades tupi-guaranis se caracterizariam por um igualitarismo radical suscitam muitas reticências actualmente, nomeadamente porque as diferenças físicas e psico-sociais possibilitaram o aparecimento de desigualdades sócio-políticas. A estrutura social seria sem dúvida pouco especializada, tendo, todavia, gerado algumas hierarquias. No entanto, é certo a existência de uma forte tendência comunitária e de solidariedade nos membros de uma mesma tribo.
(continua)

1.6.10

BRASIL- FORMAÇÃO (10)


Em 1500 as sociedades do hemisfério ocidental agrupavam-se em três tipos.  (1) As sedentárias, baseadas na agricultura permanente, normalmente com estruturas socias, políticas, tributárias e religiosas associadas, podendo subdivirdir-se em dois géneros: as "imperiais" (Azteca; Inca) e "não imperiais" (Chibcas, na actual Venezuela e Colômbia; Aruaques, nas Antilhas). (2) As sociedades semi-sedentárias, com uma agricultura semi-itinerante, dando grande importância à caça e pesca, com mudança periódica de local, não se verificando uma estratificação social tão complexa. Existiam predominantemente no norte do México, em zonas da Colômbia e Chile e em grande parte da América do Sul, da Venezuela ao Paraguai. (3) As sociedades não-sedentárias, constituídas por caçadores-recolectores, cujo habitat era o planalto brasileiro (portanto, de origem Macro-Jê), o deserto do Chaco (Bolávia e Paraguai), nas pampas (Argentina e Uruguai) e na costa sul do Chile.
Portanto, quando a frota cabralina chegou ao Brasil, o litoral sul-americano era ocupado, fundamentamente, por sociedades semi-sedentárias, a chamada "cultura da floresta tropical", com grande falta de estratificação social e de autoridade de poder. As sociedades Tupi do litoral adoptaram um padrão de subsistência assente no cultivo de raízes, em especial de mandioca, na caça e na pesca.
(A continuar)

23.5.10

BRASIL - FORMAÇÃO (9)


É possível traçar um quadro aproximado da distribuição das diversas "nações" ameríndias que controlavam o espaço e o sertão brasílico, no princípio do séc. XVI.
A orla marítima, no sentido norte-sul, era ocupada pelos seguintes grupos tribais: os Aruaques, desde a foz do Oiapoque até à costa paranense, incluindo o delta amazónico; os Tremembés - "alagadiço" - pertencentes á família Cariri e ao tronco Macro-Jê, fixados no Maranhão-Piauí, estendendo-se até ao rio Gurupi (limite sul do Pará).
A partir da foz do Jaguaribe (Ceará) entrava-se em território Tupi: os Potiguaras - "comedores de camarão" - entre aquele rio e o Paraíba; os Tabajaras - "senhor da aldeia" - estendiam-se até Itamacará; os Caetés - "mata verdadeira" - predominavam entre aquele ponto e a margem norte do rio de S. Francisco (Alagoas). Nos sertões nordestinos refugiaram-se os Cariris - "silenciosos" - do tronco Macro-Jê após terem sido expulsos do litoral pelos Tupi. Os Tupinambás - "descendentes dos Tupi" - ocupavam a costa desde a margem do rio São Francisco até à zona norte de Ilhéus. Dentre eles havia dois grupos rivais, o que gerou um estado de guerra permanente e uma grande instabilidade, como veremos mais tarde a propósito da fundação da Vila Pereira, na zona da Bahia.
Nos sertões baianos fixaram-se os Tapuia, os Tupina e os Amoipira. Do estuário do Camamu (norte de Ilhéus) até ao Cricaré (Espírito Santo) viviam os Tupiniquins - "colaterais dos Tupi" - em permanente disputa com os Aimorés (Macro-Jê). Nos sertões de Espírito Santo e de Porto Seguro viviam os Ppanás e os Goitacás, também do tronco Macro-Jê.
A área costeira fluminense, até Angra dos Reis, era controlada pelos Tamoios - "avô"; o litoral paulista entre Caraguatatuba e Iguape - ilha Comprida - pertencia aos Tupinanquins que também ocupavam grande parte do sertão. Os Guaianás, Macro-Jê, dominava a zona planáltica na faixa que se estende de Angra dos Reis a Cananeia. A partir da Cananeia, como já vimos no "episódio" anterior, entrava-se na zona dos Guaranis: Carijós, Tapes, Patos, Arachãs e que tinham por inimigos populações dos grupos pampeanos: Charruas e Minuanos, na zona do rio Uruguai e da foz do rio da Prata.
Como se vê por esta longa descrição, o Brasil era habitado, embora com baixa intensidade e as zonas ricas do litoral eram dramaticamente disputadas. Os Tupi conquistaram o litoral, vencendo os povos de origem Macro-Jê, que se retiraram para o interior, e que passaram a ser apodados de Tapuias (ou seja, Selvagens). Foi essa ideia de povos atrasados e bárbaros que os Tupi passaram aos portugueses, relativamente aos povos Macro-Jê. Foi essa a visão quinhentista dos primeiros descobridores que associaram Tapuias a todos os ameríndios bárbaros, atrasados e ferozes, correspondendo genericamete aos povos "jês".
Como veremos à frente, estas diferentes "nações" índias, iriam ser usadas nas suas rivalidades e jogadas umas contra as outras no tabuleiro estratégico em se tornaria a posse do Brasil, na disputa entre Portugal e França, primeiro, e Portugal e Holanda, depois.
(A continuar)

7.5.10

BRASIL- FORMAÇÃO (9)


Quando a armada de Cabral chegou às Terras de Vera Cruz, os Tupis e os Guaranis efectuavam enormes esforços para completar a conquista do litoral. Havia uma imperiosa necessidade de dominar o nicho ecológico que fornecia recursos alimentares em abundância, em especial peixe, moluscos, tartarugas e sal. Acresce que os recursos cinegéticos eram parcos para fornecer a quantidade necessária de proteínas. A solução era o litoral.

Foi renhida a luta pela várzea amazónica e pela orla marítima. Em 1500, os Tupis ocupavam a mais significativa parte da zona costeira compreendida entre o Ceará e a Cananeia (São Paulo). Os Guaranis estavam estabelecidos a sul do Trópico de Capricórnio, dominando a faixa litoral situada entre a ilha da Cananeia e a lagoa dos Patos (Rio Grande do Sul), além de importantes regiões no interior dessa zona.
(A continuar)

25.4.10

BRASIL - FORMAÇÃO (8)


Tínhamos ficado na subdivisão dos dois grandes troncos ameríndios, os Macro-Jê e os Macro-Tupi. Tendo os primeiros ocupado, fundamentalmente, o Planalto Central e a Bacia do Amazonas e os Macro-Tupi, em especial os vários subgrupos Tupi-Guarani, a orla marítima e as zonas das bacias dos principais rios brasileiros.

As migrações dos Tupi-Guarani levaram  a que por volta dos séc. VIII-IX (da nossa era), se tivesse dado a separação linguístico entre o Tupi ("pai supremo") e o Guarani ("guerra"). Os Tupi instalaram-se definitivamente na região costeira tropical (ver mapa em cima). Os Guarani estabeleceram-se na área sub-tropical: Mato-Grosso do Sul, região meridional do Brasil, Paraguai, Uruguai e Nordeste da Argentina. Os Tupi aperfeiçoaram a cultura da mandioca. Os Guarani, a do milho. Podemos dizer que a fronteira os dois grupos linguísticos passa algures a sul do rio Tietê (que banha São Paulo).
(a continuar)

26.3.10

BRASIL - FORMAÇÃO (7)


Embora seja muito discutível a origem dos Macro-Jê, eles acabaram por se concentrar no planalto brasileiro, tendo-se subdividido há cerca de 5000 anos a.C. em várias famílias que se dispersaram pela zona planáltica. Destaque para os Jê, Camacã, Maxacali, Pataxó, Cariri, Jeicó, Ofaié e Guató. Depois, nova cisão por volta de 1000 a.C. deu origem a quatro novos grupos: Timbiras, Caiapó, Suiá e Acuém. Novas cisões em 500 a.C. determinaram o aparecimento de novas línguas e a expansão da ocupação no planalto Central e pela zona da bacia amazónica.

Por seu turno, o tronco Macro-Tupi é constituído por sete famílias: Tupi-Guarani; Mundurucu; Juruna; Ariquém; Tupari; Ramarama e Monde, que se subdividem em vários grupos (línguas) e subgrupos (dialectos). A origem e centro de dispersão é, mais uma vez, difícil de determinar. Teses recentes apontam como provável origem a zona entre os rios Jiparaná e Aripuanã, que alimentam o rio Madeira, afluente do baixo Amazonas. A sua dispersão ter-se-ia iniciado entre 4000 e 2000 a.C. (como se vê, um intervalo enorme). Os Tupi-Guarani garantiram a sua individualização e terão desenvolvido técnicas de domesticação de plantas, fabricação de cerâmica, navegação fluvial e, acima de tudo, inventado a rede-de-dormir.

Por volta da Era Cristã, as secas prolongadas que faziam sentir desde o ano 3000 a.C. acabaram por determinar a fixação dos Tupi-Guarani nas zonas na proximidade de grandes rios, progredindo para sul e alcançando os férteis vales do Paraguai, Paraná, Uruguai e Jacuí. A partir daí, irradiaram, para leste, ocupando toda a orla marítima entre o Rio Grande do Sul e o Ceará.

Podemos assim dizer, de uma forma muito genérica, que os Macro-Jê ocuparam o Planalto Central e a bacia do Amazonas e os Macro-Tupi, em especial os vários subgrupos dos Tupi-Guarani, a orla marítima e as zonas das bacias dos principais rios brasileiros.
(a continuar)

25.3.10

BRASIL - FORMAÇÃO (6)

Os ”homens dos sambaquis” existiram entre 5000 e 2000 a.C. A “cultura sambaquiana” revela já um apurado desenvolvimento da indústria do osso, chifre e concha, bem como de estruturas funerárias. Os concheiros terão sido a origem dos primeiros núcleos urbanos, servindo a matéria-prima para a fabricação de cal.
Esta evolução determinou que a partir de 5000 a.C. se verificou um enorme movimento migratório que esteve na origem do aparecimento de grupos crescentemente diferenciados quer a nível civilizacional, quer linguístico.
Os ameríndios que se fixaram no território brasílico são agrupados, de acordo com critérios linguísticos, em dois grandes troncos: Macro-Tupi e Macro-Jê; em famílias, umas maiores situadas a norte do Amazonas (Caribe, Aruaque e Arauá); outras menores situadas a sul do mesmo rio (Guaicurú, Nambiquára, Txapacúra, Múra e Pano); e ainda em grupos isolados (Aicaná, Aricapú, Auaquê, Jabutí, Canoê, etc).
A análise da evolução das sociedades indígenas pré-cabralinas incide sobre os grupos dos troncos Macro-Jê e Macro-Tupi, dada a sua importância como agentes na formação do Brasil.
(Pintura de Albert Eckchout, séc. XVII. A continuar)

BRASIL - FORMAÇÃO (5)

A última glaciação (de Wiscosin na América ou de Wurm na Europa) terminou há cerca de 10 000 anos a.C. Passou-se do Plistocénico para o Holocénico, registando-se uma nova fase de aquecimento do planeta. O mar foi subindo gradualmente, subindo cerca de 90 metros (nível mínimo que atingira no período anterior, na zona da América do sul) atingindo os níveis actuais há cerca de 1800 anos. Desencadeou-se um processo de retropicalização, com climas muito mais húmidos, subida de temperatura, aumento significativo da pluviosidade e reexpansão das florestas tropicais que tinham ficado reduzidas a pequenas ilhas ecológicas no final do período Plistocénico, acossadas por cerrados e caatingas.

Estas novas condições climatéricas foram absolutamente dramáticas. A mega-fauna plistocénica não resistiu ao ambiente holocénico, nomeadamente ao aumento de temperatura e à alteração do coberto vegetal. Acresce a crescente actividade predatória dos humanos, agora com equipamentos de caça melhorados. A sua extinção deu-se entre 10 000 e 6000 a. C.
Isto obrigou os bandos de caçadores nómadas a adoptar outros padrões de subsistência mais diversificados. Esta adaptação das populações permitiu que a presença muita rarefeita de humanos nas terras brasílicas se expandisse pela generalidade do território, por volta de 9000 a.C. e, simultaneamente, a sua sedentarização. Por outro lado, a formação de restingas costeiras e a grande riqueza biomarinha fez convergir para o litoral significativos grupos de ameríndios que se dedicavam à apanha de moluscos, actividade que originou o aparecimento de concheiros, conhecidos por sambaquis (monte de conchas), com grande concentração no litoral compreendido entre Porto Alegre e o Rio de Janeiro.
(a continuar)

24.3.10

BRASIL - FORMAÇÃO (4)

É muito difícil e polémico determinar com exactidão quando o território de Brasil começou a ser habitado. De qualquer forma, as flutuações climático-vegetativas que foram ocorrendo ao longo de milénios, tiveram repercussões na fauna e nos habitats ecológicos, determinando movimentos migratórios no período de entre 20 000 e 13 000 anos a.C. que se podem dar como adquiridos. A fase seca com climas quentes sucessivos, determinou a diminuição dos recursos hídricos, com profundas alterações do coberto vegetal, provocando igualmente a diminuição da fauna e condicionando brutalmente a vida dos bandos de caçadores-recolectores sul-americanos. Esta situação ocorrida num período à volta do ano 20 000 a.C. determinou a migração da mega-fauna da Venezuela central para o Brasil em busca de mais água e alimentos. Tal facto originou a entrada dos primeiros paleoíndios em busca de nichos ecológicos mais atractivos. Estes terão sido os primeiros povoadores do território brasileiro.
Os principais núcleos arqueológicos do Plistocénico são o abrigo da Lapa Vermelha (Lagoa Santa, Minas Gerais), dando origem à designada “raça da Lagoa Santa”; o sítio de Alice Bóer (Rio Claro, São Paulo) e a Fase Ibicuí (Rio Grande do Sul) e datam de cerca de 1300 a.C.
Estes bandos de caçadores abatiam carnívoros gigantes, como esmilodonte (tigre-dentes-de sabre), o toxodonte (semelhante ao hipopótamo), gliptodontes e dedicuros (semelhantes a tatus, mas de enormes dimensões) e preguiças gigantes que podiam ir até seis metros de comprimento.
A expansão da seca no final do Plistocénico (13 000) incrementou o ritmo migratório para o Brasil, em busca de regiões húmidas, estabelecendo-se preferencialmente em cavernas e tocas existentes nos bordos de planaltos sedimentares. É aqui que os vamos encontrar quando o clima muda bruscamente e ocorre a última glaciação…
(a continuar)

23.3.10

BRASIL - FORMAÇÃO (3)

O facto da predominância de crânios dolicocéfalos na América do Sul, associado à descoberta no Piauí (nordeste do Brasil) de vestígios de parasitas intestinais do homem (Ancylostoma duodenalis) que não se dão bem com temperaturas abaixo dos 20 graus negativos, parece afastar a hipótese dos primeiros habitantes sul-americanos serem, predominantemente, de origem asiática, já que tais parasitas seriam forçosamente destruídos no atravessamento das zonas setentrionais americanas. Prevalece, assim, a tese da origem dos paleoíndios do sul serem, maioritariamente, provenientes da Oceânia e Melanésia, portanto da zona do Pacífico. Estas teses e descobertas recentes contrariam o que vinha sendo um dado adquirido: a origem asiática de todos os habitantes da América.
Teriam chegado por via marítima e também por via terrestre, viajando no sentido norte-sul, em três rotas principais: uma, paralela à costa do Pacífico; a segunda, acompanhando a orla atlântica; a terceira, penetrando no planalto central brasileiro.
(a continuar)

20.3.10

BRASIL - FORMAÇÃO (2)

Antes dos portugueses chegarem ao Brasil e antes de Colombo se ter enganado na rota e no continente, já havia gente na América. Agora, quem eram, donde vinham, porque ali estavam, como e quando tinham chegado, é motivo das maiores interrogações e polémicas. Não que isso interesse aos poucos grupos de indígenas que remanesceram às chacinas, doenças e álcool. Mas a verdade é que eles permanecem misturados no sangue da população americana, em especial na América do sul. Um facto que devia encher de orgulho os actuais habitantes, mas que muitas vezes se mantém como um factor de discriminação.
Fossem quem fossem, viessem donde viessem, chegaram em grupos muito reduzidos de indivíduos, em busca de de habitats ricos em caça: mastodontes, bisontes, renas, tapires e camelos. Por serem grupos pequenos, demoraram milénios a ocupar o território americano e era ainda escasso esse povoamento quando, finalmente, foram descobertos. Sim, porque foram eles que foram descobertos e não o contrário.
Na América do norte predominam grupos indígenas braquicéfalos (crânio curto e achatado na parte detrás), seguramente provenientes das culturas Diuktai e Malt'a Afontova, da Mongólia. Já na América do sul há um número muito significativo de dolicocéfalos (crânio oval), indiciando origem da Oceânia e Melanésia.
Fica, assim, indeterminada a rota de chegada à América e a sua exacta origem. Parece correcto poder aceitar-se uma tese múltipla que nos remete para uma entrada a noroeste, aquando da última grande glaciação, através do Estreito de Bering e uma outra, na ligação Ártico/Atlântico, entre as calotes glaciais da Laurentida (oriental) e da Cordilheira das Rochosas (ocidental). Estes povos migrantes seriam de origem asiática. Mas, também devem ter penetrado povos de origem melanésia, via Oceano Pacífico, aproveitando a extensa plataforma continental, muito mais ampla do que a actual. A baliza temporal de chegada é enorme: vai dos 12 aos 70 mil anos a.C.
E, assim, neste mar de dúvidas, chegamos ao povoamento inicial do território brasílico pré-lusitano...
(a continuar)

17.3.10

BRASIL - FORMAÇÃO (1)

Com os seus 8,5 milhões de quilómetros quadrados, o Brasil corresponde a 41,5% da América Latina, sendo a quinta maior formação política do mundo. Esta dimensão descomunal não resulta de factores ou acidentes naturais, nem de unidades políticas já existentes antes de 1500. Ela decorre da colonização litoral dos portugueses e da penetração progressiva para o sertão, envolvendo a conquista de território pertencentes a grupos ameríndios e da gradual anexação de terras correspondentes a 2/3 da actual superfície do Brasil (cerca de 5 milhões de quilómetros quadrados) que, segundo o Tratado de Tordesilhas, pertenciam de jure à América Espanhola.

A soberania sobre o Brasil e a demarcação de fronteiras despoletou vários conflitos ao longo dos séculos entre Portugal e a França, a Espanha, a Holanda e a Inglaterra, no período de colonização e, já depois da independência, entre o Brasil e a França (disputa sobre o Amapá), a Bolívia (posse do Acre), a Argentina, o Uruguai e o Paraguai (relacionada com o Rio da Prata e territórios adjacentes).

O Brasil situa-se em 90% do seu território na zona tropical (entre o Equador e o Trópico de Capricórnio). Sendo um país de altitudes médias relativamente baixas, o seu ponto mais alto é o Pico da Bandeira (2899m), na serra de Caparaó (na divisória entre Minas Gerais e Espírito Santo). No território brasílico situa-se a mais vasta rede hidrográfica do mundo, dividida em nove bacias, sem do de destacar a bacia do Amazonas (cerca 4 milhões de quilómetros quadrados), na zona equatorial.
É sobre este colosso mundial que vamos, a partir de hoje, iniciar uma série dedicada à sua formação, a partir de fontes diversas que serão indicadas no final. Nem todas as teses vão ser pacíficas, algumas mesmo nada pacíficas...